domingo, 22 de maio de 2011

Maçã?

Nasceu menino numa casa de mulheres. Para lhe garantir um caráter bem moldado, ensinaram-lhe desde cedo as cerimônias próprias da educação: cumprimentar, manter as mãozinhas rentes ao corpo, usar colher e garfo. Era vestido com tecidos nobres, masculinos e discretos. Recebeu cada instrução com a doçura própria da família, mas foi na religião que nada fez sentido: uma maçã? por conta de uma maçã? só por isso? falar de olhos fechados? quem vai me ouvir? não posso ver os anjos? são invisíveis? para que servem se são invisíveis? tudo alagado? tudo morreu numa enchente? Desabafava na hora de dormir, depois que as irmãs deixavam o quarto, telepaticamente, com os dois moços e a moça, luminosos, que lhe velaram o sono até ser grande demais para percebê-los.