quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Elevador

Nunca na vida ficaram cara a cara. Do parto ao emprego, foram mais de quarenta anos. Até aquele elevador enguiçar: pai e filha perdidos na imensidão do metro quadrado abismo. O tempo sumiu, assim como o chão, mais pela presença impossível de estarem juntos do que pelo perigo da queda. A alma, como um tiro, revelou, ultrapassando os limites-coleira de filha, como quem já não sabe se fala ou pensa, infantil: 'eu queria que você gostasse de mim'. O pai permaneceu afogado e morto pelos antigos jogos enevoados de covardia. A filha-mãe cresceu, e se deu conta, secamente, de ter gerado, parido e nutrido sentimentos estrangeiros que traduziram vidas e vidas, pois o menino que se nos deu, o seu nome é pai, na inversão dos fatores desta matemática sem universo.